quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Nosso amor

Você acerta quando diz que só há desejo onde há falta. E eu acerto ao lamentar a injustiça disso. Nunca disse com vocábulos, mas quando alisa com a colher as conchinhas de massa na sopa, eu sei que se arrepende um tantinho por não ter escolhido o conveniente, homem perfeito, feição germânica, quase PhD em algum processo inútil de fazer mais grana com petróleo.
já eu nunca falo sério, financeiramente, commadities, sem-terras, gasodutos, coisas que não fazem diferença. A não ser que o papo seja amor, humanidade, "O Poderoso Chefão", cena beatnik, Machado de Assis, listas de melhores bandas dos anos oitenta, tudo que não tem aver contigo.
Ele assediava com promessas concretas, juras tectônicas de amor. Eu conto umas mentiras sinceras para ilustrar o quanto você me importa. Digo firme, exagerado, fungando alguma parte lisa do teu corpo na horizontal - Voçê é minha vida, não sei o que faria sem voçê, te quero pra sempre - com aquela cara de deboche, moleque, indecifrável.
Sou sempre meio rude no telefone. Fico lendo até tarde, longe do quarto. Não falo muita coisa, abuso do "ahã". Respiro fundo toda vez que me pergunta algo solucionável com empenho. Não conto meu dia. Trago o pessoal para ver o jogo sem aviso prévio. Acho sua melhor amiga chata, mal comida, palpiteira.
Uso filmes do Fellini nas discussões e voçê diz querer respostas, não palestra, Eu mato paratas com a mão. Falo com garotas de comercial de protetor solar no msn, respondo recados no orkut, abro portas e cedo passagem para belas desconhecidas porque tenho mania de seduzir tudo e todos, o tempo todo. Busco água, demoro, a cama esfria, te irrito.
Mas toma a sopa que faço, pensando no cara perfeito. O PhD, que não teve chance de mostrar seus preconceitos, suas manias, seus medos, suas falhas, suas idiossincrasias, seus odores. Tá lá, cristalizado em algum escritório com ar condicionado e um sorriso seu na estante. Um sorriso que possa ver todo dia, mas só faço sexta, sabado, meio domingo e quartas sem futebol.
Ai vem sua melhor amiga da onça, chata, mal comida e palpiteira com trocentas pedras, paus, teorias, inquisições, sugestões, tochas, urubus e questionamentos. "Nunca vi um namorado não ligar", "nunca vi um namorado não falar", "nunca vi um namorado assim, nem assado e mé, mé, mé", "pensando bem, nunca vi namorado algum".
voçê chora baixinho sem porquê. Cito Nietzsche pra explicar porque faz isso. Voçê não tem pouco, só desejo demais. E te beijo, e te cheiro, e irrito tua pele com a barba curta, seus pelos respondem, e como dois corpos não ocupam o mesmo lugar, voçê precisa sair de si pra que eu possa entrar.
E toda a agonia se resume simples. Gemidos incontidos, poros dilatados, perfumes exalados, gostos adocicados, extremidades meladas, movimentos antissociais, palavras que deus duvida. E a beleza de tudo explode.E voçê goza pra fora. Eu gozo dentro. E o amor se explica na homogenia de olhares.
Confiamos corpo, vida e destino, nas piores e melhores horas. O sexo é cúmplice do amor, e faz dele invencível. A maior das perversões, a prisão que libera, a sacanagem mais válida de qualquer lugar. O sexo acalma a dor. A dor é o mal necessário que te ensina a amar de carne, osso, alma, comoção, gemidos e verdades.
Voçê, eu, sua amiga mal comida,todos sabemos que de petróleo sei quase nada. É, morena, mas do nosso amor, sou PhD.

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